Li por esses dias numa nota do jornal O GLOBO que o primeiro casamento poliafetivo do Rio de Janeiro, com duas mulheres e um homem, foi assinado na última sexta (01/04), às 11 horas, no 15º Ofício de Notas da Comarca. De acordo com a reportagem, o marido é funcionário público, tem 33 anos, e mora em Madureira numa casa de um quarto com as duas esposas, ambas com 21 anos. Uma delas é dona de casa e a outra estudante de técnica em enfermagem (clique em AQUI para ler a matéria na íntegra).
Lamentavelmente, esse não foi o primeiro caso de união poliafetiva ocorrido no país. No ano de 2012, um outro "trisal" do interior paulista havia registrada a sua união estável na cidade de Tupã, cerca de 500 quilômetros da capital estadual, decidindo oficializar a família.
Entretanto, com todas as minhas discordâncias morais sobre esses tipos de relacionamento fora dos padrões familiares tradicionais, respeito a liberdade individual de cada um e considero necessária a proteção institucional do Estado para que injustiças não ocorram amanhã numa eventual separação ou viuvez no que diz respeito à partilha da herança, pensionamento do INSS, direitos sobre os bens adquiridos em conjunto, etc.
No caso em tela, não seria nenhuma novidade um homem casar-se com duas ou mais mulheres. De acordo com a Bíblia, nas épocas de Moisés e do rei Davi, isso era possível segundo as leis da Torá e o marido deveria tratar as duas esposas com igualdade, mesmo se uma delas estivesse na condição de escrava (Ex 21:10). O cristianismo, porém, surgiu monogâmico e, lá pelos séculos X e XI, os judeus decidiram abolir de vez a poligamia através de um édito pronunciado por todos os rabinos da Europa sob a liderança de Rabeinu Guershon (965-1028), persistindo o costume apenas numas raras comunidades heterodoxas das duas religiões e entre os muçulmanos.
Ainda assim, quando a poligamia vigorou, havia regras. Entre os antigos israelitas, por exemplo, um homem não podia casar-se com a irmã da esposa estando esta viva a fim de que não houvesse rivalidade ou ciúmes entre as duas (Lv 18:18), o que talvez se justificasse na legislação mosaica por causa da narrativa sobre os acontecimentos perturbadores do matrimônio de Jacó com Lia e Raquel (Gn 29:23 - 30:24). E também era moralmente reprovável o marido levar as duas para o leito de núpcias de uma só vez, o que importa numa distinção bem clara da poligamia bíblica ou alcoraíta para a filosofia supostamente libertária do "poliamor".
Ocorre que os casos têm se multiplicado na nossa sociedade e o fato do STF ter reconhecido as uniões homoafetivas abriu portas para que, analogamente, comecem a surgir pedidos para a formalização de uniões entre um homem e duas mulheres, uma mulher e dois homens, dois homens e duas mulheres, três mulheres, etc. E, considerando que o Estado não pode seguir uma moral religiosa, não há como impedir pessoas maiores e civilmente capazes de viverem juntas. Logo, o melhor a ser feito é normatizar tais situações ainda que a contragosto de pessoas mais conservadoras como eu.
Sendo assim, proponho que, após o término na novela do impeachment, haja um amplo debate nacional sobre o assunto e que o nosso Parlamento busque uma saída racional e madura para tais situações ainda que seja apenas no nível da união estável para a lei não precisar afrontar os valores cristãos da sociedade. Entendo que a [b]responsabilidade em relação à procriação deverá ser inclusa[/b] visto que a maneira como nos organizamos como família pode comprometer o bem estar psicológico e a formação da futura prole.
Portanto, fica aí a minha sugestão aos nossos parlamentares para que essas questões possam entrar em pauta. Talvez o tema do Projeto de Lei n.º 4302/16 do deputado Vinícius Carvalho (PRB-SP), pastor da Igreja Universal do Reino de Deus, possa servir para dar início ao debate já que desconheço alguma outra proposição legislativa que seja contra ou a favor das uniões poliafetivas.
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