A proibição das máscaras nos protestos de rua



Durante a primeira semana de setembro, vários Tribunais de Justiça dos estados brasileiros começaram a proferir decisões autorizando a identificação das pessoas mascaradas nas manifestações de rua. Aqui no Estado do Rio de Janeiro, por determinação da 27ª Vara Criminal da Comarca da Capital, quem estiver com máscara e se recusar a retirá-la quando abordado por um policial, poderá ser conduzido a uma delegacia afim de que seja tirada sua fotografia e colhida as digitais. Trata-se, pois, de uma medida que considero bem positiva para o desenvolvimento da nossa marcha democrática e que foi aprovada pelo presidente da OAB/RJ Dr. Felipe Santa Cruz:


"Acho uma medida correta. A máscara pode ser alguma forma de expressão, mas tem servido para esconder o rosto de pessoas que se infiltram nas manifestações para fazer arruaça. Se lutamos para que os policiais sejam identificados, por que os manifestantes não deveriam seguir o exemplo?"

O texto constitucional é claro quando declara a liberdade de manifestação do pensamento mas proíbe o anonimato (art. 5º, IV, CRFB/88). Toda e qualquer expressão de caráter evidentemente política precisa ter uma assinatura/identificação. E, neste sentido, quem comparece a um protesto precisa ao menos mostrar o rosto. Seja por motivo de segurança pública ou mesmo de coerência e de transparência perante à sociedade na qual vivemos. Do contrário, o movimento será uma atitude covarde de apunhalar o opositor.

A meu ver, seria bom que o Congresso Nacional, seguindo uma iniciativa já adotada da Assembleia Legislativa do Estado do Rio de Janeiro, aprovasse uma norma proibindo em todo o país a presença de pessoas mascaradas nas passeatas e estabelecendo penalidades pecuniárias e disciplinares para determinados comportamentos potencialmente nocivos, mesmo que não configurem vandalismo. Isso já serviria para inibir a ação dos arruaceiros porque permitiria à polícia deter os elementos não identificados. Assim, os baderneiros encontrariam dificuldades para juntar-se aos manifestantes com o rosto coberto. E, se a PM estiver filmando tudo desde o início, ficará mais fácil descobrir quem jogou pedra ou quebrou o ponto de ônibus usado pela coletividade. Além da aplicação de multas, deveria a legislação suspender a participação do cidadão que tiver demonstrado um comportamento agressivo da mesma maneira como vem ocorrendo hoje nos estádios de futebol.

É certo que tais medidas preventivas e repressivas não serão suficientes para por fim à onda de violência nos protestos, mas poderão contribuir muito para promover um processo de pacificação. Muitas pessoas, inclusive eu, têm se ausentado das manifestações de rua por causa da ação dos baderneiros. E aí, se houvesse menos episódios de vandalismo e de confrontos com os PMs, os movimentos sociais ganhariam muito mais expressão de modo que os gestores públicos e os legisladores poderiam conhecer melhor as insatisfações populares.


OBS: A imagem acima foi produzida pela Agência Brasil sobre os protestos do 7 de Setembro, no Rio de Janeiro, com atribuição de autoria Mídia Ninja, conforme consta em http://www.ebc.com.br/noticias/brasil/2013/09/no-rio-19-detidos-nos-protestos-sao-liberados-e-um-continua-preso

Comentários

Levi B. Santos disse…
Como disse Luiz Felipe Pondé em um recente artigo na Folha de São Paulo:

"Os medievais esperavam a redenção do mundo pelas mãos de Deus. Nós (aqui no Brasil) esperamos a redenção pelas mãos da política, do povo e dos black blocs." - rsrs
Caro Levi,

Obrigado por comentar o texto.

Na verdade eu espero justamente o contrário das mãos desses black blocs.

Até que ponto esses grupos de mascarados não seriam inocentes úteis nas mãos dos que querem sabotar o nosso processo democrático?

Contudo, acredito que o povo engajando-se ativamente na política, com a consciência alargada, será possível a construção de um Brasil melhor. Será que a sociedade não poderia buscar uma ação com mais qualidade do que os protestos?!

Ao invés de manifestações, tenho defendido audiências públicas que seriam ambientes melhores para se promover aquilo que o papa Francisco chamou de "cultura do encontro". Foi o que defendi num dos mais recentes artigos publicados na blogosfera que se aplica tanto ao meu município quanto ao resto do país:

http://melhorarmangaratiba.blogspot.com.br/2013/10/que-tal-termos-audiencias-publicas.html
Levi B. Santos disse…
A construção de um Brasil melhor passa por uma desconstrução. As elites têm medo por que toda desconstrução, começa pelo que está em cima.

Há filósofos que vêem nos atos dos “black blocs” um simbolismo mítico: o fascínio de “destruir para reconstruir”.

O perigo é que os fascistas e os nazistas também pensaram assim. (rsrs)
Bom dia, Levi!

Eu não diria que uma desconstrução deva iniciar "pelo que está em cima". Para revolucionarmos o país, creio que deve-se começar "por baixo". Ir de baixo para cima, o que me leva a crer que uma educação de qualidade seria o caminho de modo que existe ainda um longo processo. Uma mudança lenta mas que, no "caminho", já vamos colhendo seus frutos com pessoas mais conscientes lutando por seus direitos ao invés de abrir mão deles perante as elites.

Sobre os "black blocs", tenho aí minhas indagações se suas lideranças não estariam de alguma maneira ligadas a políticos espertalhões que têm por interesse enfraquecer as manifestações já que um número maior de pessoas/eleitores nas ruas exigindo mudanças ameaçaria a perpetuação dos que hoje encontram-se no poder. E fico a indagar por que tanta lentidão da polícia em identificá-os e prendê-los?! Mas, de fato, a ideologia desses grupos, quer estejam agindo por ideal ou não, segue neste sentido que você colocou, de "destruir para reconstruir".

Sinceramente, eu posso não estar satisfeito com os políticos do momento: Dilma, Cabral, Eduardo Paes, Geraldo Alckmim e o prefeitinho de minha pequena cidade. Porém, nestes 25 anos da Constituição de 1988 (um quarto de século), muitas conquistas foram alcançadas e várias coisas avançaram. O Brasil não é mais o mesmo ainda que vários erros se repitam e tenhamos hoje casos como os do pedreiro Amarildo que a OAB chama de "desaparecidos da democracia". Todos esses casos, no entanto, nem chegam aos pés do massacre vivido nos anos da ditadura militar, do Estado Novo e da República Velha que foi autoritária e flagrantemente oligárquica.
Em tempo!

Quando você falou que nossas "elites têm medo por que toda desconstrução, começa pelo que está em cima", eu diria que o temor seria porque a desconstrução pode vir a afetar quem está em cima. Os que usam do poder político para satisfazerem seus interesses econômicos e/ou corporativistas.

Mas, por outro lado, o excesso de corrupção também pode afetar a própria elite também. Um grande empresário inteligente sabe que é possível proporcionar melhorias na qualidade de vida de uma população sem que isso prejudique suas atividades de ganho. Aliás, do ponto de vista da elite esclarecida, as deficiências na educação, na saúde e nos transportes, bem como o desvio de recursos públicos para o bolso dos políticos seriam coisas prejudiciais a elas também, não concorda?

Tirando os "black blocs" de lado, dá para ver facilmente que o manifestante comum nesses protestos não seria um anti-capitalista. Ele é um sujeito indignado com tanto descaso e falta de seriedade e de comprometimento dos nossos gestores, legisladores e magistrados. Esse seria o perfil da massa desorganizada que se encontra através da internet para ir nas passeatas enquanto os black blocs sim seriam grupos organizados e que agem debaixo do direcionamento de seus líderes.
Levi B. Santos disse…
“Todos esses casos, no entanto, nem chegam aos pés do massacre vivido nos anos da ditadura militar, do Estado Novo e da República Velha que foi autoritária e flagrantemente oligárquica” (Rodrigo)

Democracia, conhecemos só de nome. (rsrs)

Os massacres de hoje, Rodrigo, podem ser considerados “cafés pequenos”.

Se olharmos para trás, veremos que o porrete foi o instrumento mais usado nos primeiros dias de Nossa República (após 15 de novembro de 1889) pelos supostos heróis dos nossos livros de História do Brasil.

O Marechal Deodoro da Fonseca, após 40 dias de proclamada a República fechou o jornal “A Província de São Paulo – que originaria depois o Jornal o “Estado de São Paulo”, fechou e destruiu o Jornal “O Tribuno” de Pernambuco. Mandou a polícia espancar os redatores do “Diário de Notícias” e a “Província do Pará”. Prendeu os redatores dos jornais do Rio de Janeiro, do Rio Grande do Sul e do Paraná. Mandou destruir o prédio de um dos maiores jornais do país, na rua do Ouvidor – “A Tribuna”. Fez o que nunca a Monarquia de D. Pedro II ousou um dia sonhar.

A utopia de uma democracia sempre desvanece com o tempo. Os discursos democráticos são como as pétalas de uma rosa que por alguns dias permanecem belas e viçosas, para depois murcharem, secarem e ser levadas ao léu pelos ventos. (rsrs)
Caro Levi,

Confesso que me preocupo com a preservação de nossa democracia já que o nosso povo ainda não tem uma cultura verdadeiramente democrática. Frequentemente ouço nas ruas pessoas defendendo regimes militares e pena de morte para bandidos. Ontem mesmo, enquanto eu estava no ônibus fazendo uma sofrida viagem do bairro dos subúrbios carioca de Coelho Neto para Itaguaí, um homem que aparentava ser de condição humildade defendia que a polícia usasse de meios de tortura como choques elétricos contra os manifestantes dessas passeatas. Nenhuma alma ali foi capaz de manifestar-se dizendo que práticas como essas são violadoras de direitos humanos.

Trata-se de um problema que está lá na nossa formação e tem a ver com o que as pessoas aprendem em casa, bem na intimidade do lar, já que hoje a mídia não propaga mais esses valores explicitamente. E, se a população acaba consentindo, ela também se torna refém de si própria. Foi o que disse certa vez Wilhelm Reich (1897-1957) em seu desabafo publicado postumamente Escuta, Zé Ninguém de que o homem é o seu próprio navio negreiro.

Lamentavelmente, a nossa República começou com um golpe militar, jamais foi minimamente democrática, mesmo depois de Floriano Peixoto, sofreu os 15 anos de varguismo, e, finalmente, tivemos o regime da Constituição de 1946 que não durou nem 20 anos. Mas agora, com a atual Carta de 1988, temos aí a oportunidade de aprendermos a vivenciar a democracia e torço para que as pessoas esclarecidas continuem resistindo às investidas contrárias, quer sejam da direita ou da esquerda.

Ditadura nunca mais!
Eduardo Medeiros disse…
Eu gostaria muito que a ação dos black blocs fosse de fato, política.Mas parece mesmo que são manipulados por aproveitadores.
Não deixa de ser classificada como uma ação política. Porém, uma política de baixa qualidade...

Vejo aproveitadores entre eles. Tanto no meio das lideranças como na militância.
Valéria Gomes disse…
Se é uma manifestação, penso que é necessário mostrar a cara, o povo não tem que se esconder, basta não destruir o patrimônio nem medir forças com a polícia, afinal, queremos conquistar melhorias e não destruir o que já conquistamos. Um forte abraço à todos!!!
Concordo contigo, Valéria. Acho, inclusive, que e as pessoas mostram a cara a manifestação torna-se ainda mais forte. Afinal, anonimato deve ser somente para denúncias que acarretem perigo de vida ou à família do denunciante. Ou então quando as pessoas querem falar sobre detalhes de sua vida privada com fins terapêuticos sem se expor e/ou a terceiros. Não seria o caso dos protestos. Obrigado aí pelos comentários.