O noticiário de 2063

Considerando a tendência de aumento na expectativa de vida, existem boas possibilidades de que uma pessoa de minha idade, nascida nos anos 70, viva mais uns 50 anos. No entanto, fico a pensar nas condições do nosso planeta na segunda metade do século XXI. Será que o mundo dará algum gosto para as pessoas quererem viver tanto?

Com tantas variáveis incidindo sobre as tendências sociais, políticas, econômicas, científicas, tecnológicas e culturais, qualquer projeção do cenário global para daqui cinco décadas será pura fantasia. Temos, a meu ver, um número bem grande de probabilidades. Imaginando um futuro pessimista, mas que deixe muitos de nós vivos para conferirmos os resultados de ações e omissões praticadas, imaginei esta fictícia apresentação de um noticiário da TV do ano de 2063:

Às nove e meia da noite de uma sexta-feira de setembro, um homem octagenário chega em seu apartamento de vinte metros quadrados no sexto andar do subsolo de um prédio na cidade grande cujas prestações do programa habitacional ainda pagava. Após ter trabalhado onze horas, ele precisaria acordar bem cedo no dia seguinte para dar continuidade ao serviço na empresa onde era empregado. A única distração que tinha era o telejornal.

Através de um gesto feito no sensor da residência, ligado ao computador único do apertamento, a telinha inteligente de TV é automaticamente ligada exibindo o fechamento da cômica novela das oito. Pega então uma bebida na geladeira e senta exausto no seu sofá cama.

Começa o noticiário e os dois apresentadores surgem em três dimensões como se estivessem dentro da casa. Ou melhor, como se o telespectador fosse sugado para o interior da TV. Começam então a falar:

- Brasília, 28 de setembro. O Congresso Nacional reunindo-se extraordinariamente aprova mais uma mudança no Estatuto da Terceira Idade. Passam a ser considerados idosos os cidadãos com 110 anos.

- Houve manifestações violentas em todo o país e mais de duzentas pessoas mascaradas foram presas pela polícia. Sindicalistas protestavam também contra a proposta de aumento da idade mínima da aposentadoria de 100 para 120 anos.

- Um ataque com armas nanotecnológicas deixou oito mil mortos no Oriente Médio e até agora nenhum grupo terrorista assumiu a autoria do atentado.

- Nos Estados Unidos o governo emitiu alerta máximo contra furacões. É esperada a tempestade mais forte dos últimos dez mil anos.

- O dólar torna a subir e, segundo a Fundação Getúlio Vargas, a inflação da semana passada foi de 43%.

- É criado o imposto sobre a propriedade de animais domésticos.

- Um avião cai misteriosamente no deserto amazônico sem deixar pistas e a aeronáutica ainda não pôde iniciar as buscas por falta de combustível.

- O advogado do ex-senador Carlos Antonio Tetraneto, acusado de desviar um trilhão de reais novos da Fundação José Sarney, conseguiu um habeas corpus no Supremo Tribunal Federal e vai responder ao processo em liberdade.

- Robôs assassinos voltam a assaltar motoristas na Avenida Luís Inácio Lula, em São Paulo.

- Evangélicos fazem show gospel em Belo Horizonte e pastores protestam contra a nova lei que determina a destruição de sêmen e de óvulos nos bancos genéticos de pessoas falecidas.

- A governadora do Rio Mariana Menininha anunciou que vai construir um terceiro Maracanã para a Copa de 2070.

- Meteorologistas estão prevendo calor de 50 graus para este final de semana.

- E assistam ainda os gols do Flamengo pela série B do Brasileirão.

- Tudo isso você vai ver em instantes depois da propaganda eleitoral obrigatória do Partido Zoofilista Islâmico Brasileiro.

Com raiva dos políticos, o homem resolve desligar a TV e, naquele mesmo instante, ocorre mais um apagão de energia. Sem nada para fazer, ele vai dormir.

Comentários

Levi B. Santos disse…
Um brasileiro condecorado é manchete de primeira páguina em todos os jornais do país, por bater o recorde de menos tempo sem ser vítima de violência:

Ele conseguiu a proeza de ser assaltado apenas seis vezes em um mês. (kkkkkkkk)
Prezado Levi,

O problema da violência realmente preocupa. Resolvê-lo é uma questão de anos e décadas. Trata-se de um processo que envolve diversas variáveis e causas. Algo que a nação brasileira precisa encarar a partir de agora com seriedade.

Abraços.
Eduardo Medeiros disse…
Rodrigo, bom exercício de futurologia. Algumas coisas serão inevitáveis: o aumento da idade para se aposentar, por exemplo. Se a expectativa de vida continuar aumentando, isso será inevitável, ou então, o sistema previdenciário quebra.

Mas bom seria que no futuro, não houvesse mais dinheiro, nem trabalho.
As máquinas produziriam tudo o que a humanidade necessitaria,e todos teriam o básico para se viver bem, sem precisar comprar ou vender.

Não sei se isso é viável de fato, é só uma ideia que eu sempre penso sobre o futuro.

Agora, o Levi foi bem pessimista, hein??? rsss

E enfim, o flamengo estará na segundona...rssss
Caro Edu,

Obrigado pela atenção em comentar minha postagem.

Antes do governo promover os ajustes na Previdência Social, defendo que o Estado brasileiro pague pelo rombo histórico de todos esses anos em que as contribuições dos trabalhadores foram usadas para outros fins. Se o nosso dinheiro fosse usado corretamente, a Previdência ainda teria hoje alguma folga e não teríamos precisado passar pelas reformas feitas por FHC e Lula.

Interessante a sua ideia futurológica. Um mundo sem trabalho e dinheiro! Porém, penso que para chegarmos nesse nível, teremos que educar a população para aprender a usar o tempo livre. Há um ditado que diz: "cabeça vazia é oficina do diabo". E, infelizmente, durante os feriados prolongados, pessoas ainda fazem muitas besteiras. Nem todas. Logo, de alguma maneira precisamos ocupar o ser humano com algo útil. Tanto é que, no Japão, velhinhos com seus 90 anos ainda trabalham. Logo, concluo que é o trabalho que precisa ser revisto. Que tal algo que seja libertador para o homem ao invés de explorador?! Veja, por exemplo, o caso do trabalho infantil que, ao invés de atrapalhar os estudos da criança, poderia auxiliar o menor num aprendizado prático e disciplinado da vida.

Muito já se escreveu acerca do "ócio criativo". Eu, todavia, não posso considerar essa ociosidade como sendo o não fazer nada. O antigo filósofo grego tinha diante de si o grande desafio de pensar a organização política da sociedade, o que não seria tarefa fácil e exigiria dele grande responsabilidade, não concorda?

Se amanhã tivermos um mundo operado por máquinas, esta mudança exigirá de nós um grande estudo e conhecimento. Se um dia as máquinas pararem, teremos que saber reprogramá-las e usar de alternativas produtivas. O básico feito pelos nossos ancestrais nunca poderá ser ignorado! Assim, o tempo de escolaridade vai ter que subir. O trabalho do homem será um permanente estudo que contribua para o bem estar coletivo em todos os aspectos. Sem esquecermos que alguém precisará trabalhar no monitoramento das máquinas e ser bem estimulado financeiramente.

A respeito do Mengão, é só brincadeirinha. Não se assuste! Até hoje o rubro-negro tem seguido invicto no Brasileirão e espero que assim nossos netos possam comemorar no bicentenário do maior time carioca.

Abração!