O Einstein religioso: Sintético manual de funcionamento






Einstein foi morar nos EUA para se livrar do nazismo mas ficou  mal com os cristãos americanos quando disse que a ideia de um Deus pessoal lhe era estranha e até ingênua. Era um religioso no sentido do deslumbramento que o cosmos lhe causava. Declarações como “Sou um descrente profundamente religioso. Isso é, de certa forma, um novo tipo de religião” não caiu bem nos ouvidos cristãos fundamentalistas como também esta outra afirmativa: “Jamais imputei à natureza um propósito ou um objetivo, nem nada que possa ser entendido como antropomórfico. O que vejo na natureza é uma estrutura magnífica que só compreendemos de modo muito imperfeito...é um sentimento genuinamente religioso, que não tem nada a ver com misticismo”.


Os ataques começaram a aparecer. O bispo católico de Kansas City disse: “É triste ver um homem que descende da raça do Velho Testamento e de seus ensinamentos negar a grande tradição dessa raça”. Um outro religioso católico foi enfático: “Não há nenhum outro Deus que não um Deus pessoal...Einstein não sabe do que está falando(...)” Um advogado católico americano escreveu para Einstein:


“Lamentamos profundamente que o senhor tenha feito a declaração(...) em que ridiculariza a ideia de um Deus pessoal. Nos últimos dez anos, nada foi tão bem calculado para fazer as pessoas acharem que Hitler tinha alguma razão ao expulsar os judeus da Alemanha quanto sua declaração. Admitindo seu direito à liberdade de expressão, digo ainda assim que sua declaração o constitui em uma das maiores fontes de discórdia dos Estados Unidos.”


Um rabino de Nova York mandou um recado: “Einstein é sem dúvida um grande cientista, mas suas opiniões religiosas são diametralmente opostas ao judaísmo”.

A carta do fundador da Associação do Tabernáculo do Calvário, em Oklahoma dizia: “Não vamos abrir mão de nossa crença em nosso Deus e em seu filho Jesus Cristo, mas o convidamos, se o senhor não acredita no Deus do povo desta nação, a voltar ao local de onde veio...” Era impossível para os cristãos americanos engolir outras falas de Einstein como “se você ora a Deus e lhe pede algum benefício, não é um homem religioso”. Uma conferência do clero em Nova York em 1940 fez uma oposição considerável à “religião einsteiniana”.


Mas verdade seja dita, Einstein nunca considerou a sua rejeição de um Deus pessoal como uma negação de Deus. Chegou mesmo a declarar que a crença em um Deus pessoal parecia “preferível à falta de qualquer visão transcendental da vida”. Ele declarou também que “os princípios mais elevados para nossas aspirações e juízos, nos são fornecidos pela tradição religiosa judaico-cristã”. Em uma mensagem que ele enviou à Conferência Nacional de Cristãos e Judeus em 1047 ele declarou: “Se os fiéis das religiões atuais tentassem sinceramente pensar e agir segundo o espírito dos fundadores dessas religiões, não existiria nenhuma hostilidade de base religiosa entre os seguidores dos diferentes credos. Até os conflitos no âmbito da religião seriam denunciados como insignificantes”.


Einstein nunca gostou de ser chamado de ateu. Numa conversa com o príncipe Hubertus de Lowenstein declarou: “O que realmente me aborrece é elas (as pessoas que dizem que Deus não existe) citarem a mim para corroborar essas ideias”. Não era fácil para um “cristão comum” e um “ateu comum” entenderem o pensamento de Einstein sobre religião e transcendência. Tanto um quanto o outro ora o citava para embasar suas ideias, ora tinha que perceber que ele as negava... Einstein nunca considerou que sua negação de um Deus pessoal como negação de Deus. Recentemente  o Osservatore Romano, publicação da Igreja Católica Romana, a proclamou que a religião cósmica de Einstein era um autêntico ateísmo, ainda que camuflado de panteísmo cósmico. Mas depois a publicação acabou por se retratar...


A declaração mais famosa de Einstein, ainda vai continuar sendo mal entendida por apologistas cristãos e ateus desavisados: “a ciência sem a religião é manca, a religião sem a ciência é cega”.



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citações: Max Jammer, "Einstein e a religião.
Ed Contraponto

Comentários

Eduardo Medeiros disse…
como eu não sei mais se aqui ainda tem fila para postagem, taí...
"Não há dúvida de que a doutrina de um Deus pessoal que interfere nos eventos naturais jamais poderia ser refratada, no sentido verdadeiro, pela ciência, pois essa doutrina pode sempre procurar refúgio nos campos em que o conhecimento científico ainda não foi capaz de se firmar. Estou convencido, porém, de que tal comportamento por parte dos representantes da religião seria não só indigno como desastroso. Pois uma doutrina que não é capaz de se sustentar à "plena luz", mas apenas na escuridão, está fadada a perder sua influência sobre a humanidade, com incalculável prejuízo para o progresso humano."
"A meu ver, portanto, a ciência não só purifica o impulso religioso do entulho de seu antropomorfismo, como contribui para uma 'espiritualização' religiosa de nossa compreensão da vida."
"Quanto mais avança a evolução espiritual da humanidade, mais certo me parece que o caminho para a religiosidade genuína não passa pelo medo da vida, nem pelo medo da morte, ou pela fé cega, mas pelo esforço em busca do conhecimento racional."
"Neste sentido, acredito que o sacerdote, se quiser fazer jus a sua 'sublime' missão educacional, deve tornar-se um professor."
"Ciência e Religião" (1939-1941) Einstein, Albert, 1870-1955.

Einstein fala de religiões, não de cristianismo e não professa amor por nenhuma.
Levi B. Santos disse…
"A meu ver, portanto, a ciência não só purifica o impulso religioso do entulho de seu antropomorfismo, como contribui para uma 'espiritualização' religiosa de nossa compreensão da vida."

Matou a cobra e mostrou o pau. (rsrs)
Levi B. Santos disse…
A título de curiosidade:

Em 2005, Yeshayahou Leibowitz ficou entre os vinte mais influentes Israelenses.

Certa feita, um de seus alunos, orgulhoso de sua nacionalidade, perguntou-lhe:

“ ― Einstein não é um bom presente dado à Ciência pelo povo Judeu?”. Leibowitz, respondeu de bate-pronto:

“― Não, Einstein é um bom presente que a Ciência deu ao povo Judeu” (rsrs)
Caro levi, Esta é uma das diferenças entre a ciência e a religião. A ciência mata a cobra e mostra a cobra. A religião mata a cobra e mostra o pau. A cobra morta pela ciência tem cor, espécie, tamanho, peso, sexo e peçonha. A cobra morta pela religião é virtual onde uns pôe nela pé, rabo, cabeça e até asas. Algus podem até dizer que ela tocava violinos.
Levi B. Santos disse…
É Miranda

A religião realmente não matou a serpente. Ela é muito astuta e está aí mais viva que nunca, resistindo as armas "celestiais" (paus, espadas, etc).

Mas vamos procurar ativar os nossos neurônios para destrinchar a charada de Einstein que o Eduardo deixou no desfecho do seu texto: a ciência sem a religião é manca, a religião sem a ciência é cega. (rsrs)

Acho que primeiro temos que saber a que "religião" Einstein, no seu adágio, estava se referindo: ao sentimento, a instituição religiosa, a neurose eclesiástica??

Eduardo Medeiros disse…
O que me chama a atenção em Einstein, é que mesmo ele achando que a religião antropomórfica é "ingênua", ele diz que ela é" preferível à falta de qualquer visão transcendental da vida". O que o fascinava era a própria vida, o universo, e isso o levava a ver além do material (ainda que neste além não houvesse deuses); era algo de sentimento mesmo; a ciência não deveria abandonar tal deslumbramento que vem da religião e a religião deveria aprender a abandonar as ingenuidades através da ciência.
Edu meu caro,

Alguns realistas tem no subconsciente a necessidada de uma liderança espiritual que nenhuma reliião preenche nem a ciência explica. A religião que percebesse suas ingenuidades com fundamentos na ciência, se descaracterizaria como religião. Cada qual no seu cada qual. Se Einstein tivesse nascido nos anos 70, religião alguma faria parte de suas preocupações.
Levi B. Santos disse…
"Sustento que o sentimento religioso cósmico é o mais forte e o
mais nobre incitamento à pesquisa científica."
(Albert Einstein)

Então ficaria assim o adágio de Einstein, com que o Edu, provocativamente, colocou no desfecho no seu texto?. Ou não? (rsrs):

A Ciência sem o "sentimento religioso cósmico" é manca. O "sentimento religioso cósmico" sem a Ciência é cego”.
Eduardo Medeiros disse…
e não é essa "religião descaracterizada" que Eintein defende? Seria descaracterizada, mas continuaria sendo religião?
Eduardo Medeiros disse…
rsss eu acho que o sentido era exatamente esse.
Não é um anexo, é um adendo ou apêndice. Estou acrescentando no texto de Eintein suas próprias palavras.
Elídia :) disse…
Meus amigos, por pura falta de tempo e talvez até negligência, tenho-me ausentado...leio, só não tenho mais temp de elaborar textos, pois devido a exigencia deste sitio não acho conveniente sair escrevendo qualquer coisa só pra postar...posso sugerir algupem para a confraria?Kleber Buenos-Aires, psicanalista, q ja andou cometando aqui.. tenho lido seus textos e acho profundos e belos, que mergulham fundo na alma humana, outros temas e parece ser um ex-religioso rsrsrs..não seria um perfil dos ótimos ? Aguardo sua resposta...Abraços calorosos.
Gabriel Correia disse…
Caros confrades, vocês estão me devendo VIKTOR FRANKL. Se esbarramos no "sentimento religioso cósmico" esse é o caminho natural.
Eduardo Medeiros disse…
Elídia, nossa escritora sumida, tudo bem??? hehhhh

Por mim, acharia ótimo ter mais um colaborador dessa estirpe!
Eduardo Medeiros disse…
amigo, Gabriel, eu já falei brevemente da logoterapia do Frankl aqui http://cpfg.blogspot.com.br/2010/09/em-busca-de-sentido.html
Mas de uma forma bem resumida; podemos voltar ao assunto brevemente de forma mais densa. Acho que o LEVI seria a pessoa indicada para tal empreitada.

abraços
Levi B. Santos disse…
Caro Gabriel Correia

Li pouco sobre Victor Frankl. Pelo que sei, sua teoria tende a explicar o homem dentro de uma unicidade, sem depender desse “jogo” consciente versus inconsciente.

Mas Freud se supera com seu conceito de ruptura, de desamparo, de angústia, da solidão do ser humano em seus primeiros meses de vida. Freud faz um percurso analítico que me parece irrefutável, quando, por exemplo, diz: ” estou certo de que existem memórias e sentimentos soterrados, provavelmente muito antigos , tão profundamente soterrados e bem guardados, que é provável que eu jamais tenha acesso a eles. Grande parte de nossos motivos encontra-se em um lugar intermediário”.

Usando a linguagem metafórica, eu diria que a psicanálise é mais científica na medida em que escavaca a terra ao redor da raiz para entender a árvore; enquanto que, na minha visão, a logoterapia, não se interessa tanto a fim de estudar o solo e a raiz da árvore e sim o fruto em si. Para Freud, mais interessava o mergulho nas condições do solo em que está fincada as raízes, para daí procurar compreender o mecanismo de absorção que vai formar a seiva, que por fim vai determinar se o fruto sairá sadio ou atrofiado. (rsrs).
Levi B. Santos disse…
SIM

De minha parte, o convite está feito para o Kleber participar da nossa Trindade. Digo Trindade, porque o ping-pong está praticamente entre Edu, Miranda e a minha pessoa. (rsrs)

Falta o voto do Miranda, para a gente saber se o placar será 3X0 ou 2X1 para o novo confrade. (rsrs).

Não custa lembrar que Jung achava a sua quaternidade mais representativa do que a Trindade Freudiana (Ego -Supergo e Id). (rsrs)
Gabriel Correia disse…
Caros confrades, visitei o post antigo do FRANKL. A coisa ferveu.
O tema é digna de ser revisitado, com mais consistência e com novos comentários, digamos... menos apaixonados rsssss.
Edu se o Levi se esquivar vai ter que ser contigo mesmo! rssssss.
Tanto faz 1x0,2x0,3x0 ou 2x1. Já comecei a participar com voto vencido. He, he, he
Pois bem. Não conheço o cidadão em questão, mas se vier para somar que seja bem vindo. Espero que não seja mais um nome para a lista dos foragidos da gaiola.