O plebiscito do Reino Unido e a economia brasileira




Nesta quinta (23/06), uma votação histórica está decidindo se o Reino Unido deixará ou não a União Europeia. Segundo notícias na internet, o plebiscito do "Brexit" teve uma quantidade record de eleitores inscritos em que cerca de 46,4 milhões de pessoas apresentaram-se para participar da consulta popular, sendo este um número superior ao das eleições gerais de 2015.

Para muitos aqui no outro lado do oceano, o debate se o Reino Unido permanecerá ou não na União Europeia parece irrelevante ou ter uma importância quase mínima. Só que não é bem assim! Pois se trata da saída de um parceiro de peso e com forte influência liberal na política do bloco, o que, por sua vez, respingaria nas nossas relações comerciais com a Europa.

Preocupantemente, as pesquisas têm acusado empate técnico, muito embora as principais autoridades do Reino Unido estejam se posicionando pela permanência do país na União Européia. Na terça (21), o primeiro-ministro da Grã-Bretanha, David Cameron, fez um apelo nesta aos eleitores, em especial aos mais velhos, para que pensem no impacto que deixar a UE terá sobre o país e as futuras gerações, advertindo para o risco enorme que significará a saída do bloco em razão da irreversibilidade desta decisão.

Assim, para que nos mantenhamos informados e possamos formar uma opinião a respeito, compartilho a seguir um artigo extraído da edição desta quinta-feira (23/06/2016) do informativo Ex-Blog do César Maia, o qual leva o nome do ex-prefeito da cidade do Rio de Janeiro César Maia que também é um importante cientista político do nosso país. Confiram o texto:


INTERESSE MAIOR DO BRASIL É QUE O PLEBISCITO MANTENHA O REINO UNIDO INTEGRADO À UE! 


Por César Maia

1. Há alguns dias, representantes do governo brasileiro foram interpelados por membros da Confederação de Indústrias Agrícolas do Reino Unido para saber a posição do Brasil sobre o Brexit. "Nossa prioridade é negociar com a União Européia e não com o Reino Unido individualmente", respondeu o alto funcionário do governo brasileiro presente na reunião. 

2. Por trás da defesa do governo brasileiro pela permanência do país no bloco, estão não apenas aspectos econômicos, mas também políticos. Isso porque o Reino Unido tem sido um dos principais "fiadores" das negociações para o tratado de livre comércio entre o MERCOSUL e a União Européia. Encabeçado pelo Brasil, o acordo sofre resistência de países como a França, temerosos de que produtos agrícolas sul-americanos possam enfraquecer a agricultura local. 

3. Por outro lado, apesar de subsidiada, a agricultura não é o forte da economia do Reino Unido (o setor responde por menos de 1% do PIB britânico), mais interessado nas perspectivas de negócio que se abririam com a ampliação do fluxo comercial ─ especialmente para os setores de indústria e de serviços. O MERCOSUL negocia há cerca de 16 anos com a União Européia um acordo para ampliar o intercâmbio comercial entre os dois blocos. O objetivo é que o tratado envolva não só questões de barreiras tarifárias, mas também convergência e padronização de regras que facilitem a integração 

4. Em maio deste ano, pela primeira vez desde 2004, União Européia e MERCOSUL trocaram ofertas tarifárias para negociar um acordo de livre comércio do qual foram excluídos "produtos sensíveis" ─ como carne bovina e etanol ─ para o bloco europeu, em grande parte por pressão da França, maior potência agrícola européia, e de outros países. Mesmo assim, entidades agrícolas europeias criticaram o avanço das negociações. Segundo estudos citados por elas, a UE poderia perder até 7 bilhões de euros se firmar o tratado com o MERCOSUL, "que já é um grande exportador de matérias-primas agrícolas". 

5. A UE e o MERCOSUL vão "analisar ofertas" e voltarão a se reunir em breve, antes das férias do verão europeu (inverno no Brasil), segundo o Itamaraty. Mas não é só essa a razão que explica a preferência do Brasil em negociar com a UE. Se somados todos os seus Estados-membros, o bloco europeu é hoje o principal parceiro comercial do Brasil ─ com trocas anuais da ordem US$ 70,6 bilhões.

6. De fato, é muito mais vantajoso para o exportador brasileiro negociar com um bloco do que com um país individualmente. Estamos falando de um mercado de 500 milhões de pessoas contra um mercado de 64 milhões. Na hipótese de o Reino Unido deixar a UE, seria necessário criar novas normas e se adaptar a elas. Isso leva tempo e custa dinheiro. Na outra ponta, o Reino Unido responde, atualmente, por apenas 1,5% das exportações brasileiras. Como 15º parceiro comercial do Brasil, está longe de ser economicamente desprezível, mas sua importância geopolítica dentro da EU é "muito maior". 

7. Ademais, a saída do Reino Unido da UE poderia provocar uma crise financeira na Europa cujas implicações seriam, sem dúvida, sentidas no Brasil. Além disso, traria de volta o risco de instabilidade no continente aumentando tensões e aprofundando divisões. Essa instabilidade não é benéfica para o Brasil em termos de comércio. Porém, na eventualidade de o Reino Unido sair da UE, o Brasil ou até mesmo o MERCOSUL poderiam ter mais "facilidade" para negociar um acordo bilateral com o país "a longo prazo". 

8. Se o Reino Unido realmente optar por abandonar a UE, talvez seja mais fácil para o Brasil - ou até mesmo para o Mercosul - negociar um acordo bilateral. Um dos maiores problemas na negociação atual é a agricultura, que hoje já não tem presença forte na economia britânica. Sem dúvida para o Brasil é mais vantajoso negociar com a UE. Mas não parece ser difícil que um acordo bilateral com o Reino Unido seja firmado numa eventual saída. Os novos governos brasileiro e argentina já se mostraram inclinados a explorar novos mercados. 


OBS: Imagem acima extraída de uma página do portal da EBC conforme consta em http://www.ebc.com.br/noticias/internacional/2015/11/cameron-expoe-condicoes-para-permanencia-do-reino-unido-na-uniao 

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