sexta-feira, 29 de março de 2024

O Reino Que se Faz na Existência



"A Descida da Cruz" - Jacopo Pontormo
pintor italiano do período do maneirismo (1494-1557)



NÃO IMPORTA   quem você é ou onde esteja, a mensagem de Jesus é UNIVERSAL. Sim, a princípio era uma mensagem profundamente enraizada nas categorias de pensamento do seu próprio povo, os judeus do século I, mas as consequências dela teriam efeitos universais. 

Muitas foram as interpretações sobre Jesus. Centenas  de livros foram escritos sobre sua vida e missão, muitos em flagrante oposição uns aos outros. Quem é dono da interpretação certa sobre Jesus? O apóstolo Paulo, que praticamente definiu a dogmática cristã sobre a vida e morte de Jesus? Ou os cristãos gnósticos estavam certos? Orígenes tinha uma melhor compreensão ou seria Tertuliano? Quem é "dono" de Jesus?

A ESSÊNCIA  HUMANA  deve ser construída ao longo da existência humana. Nada está pré-estabelecido por Deus (apesar desse ser um pensamento comum no meio cristão e eu acreditar que algumas coisas em nós são inatas). É desejo humano que se vê  consciente da própria inconcretude, da própria fragmentalidade, da própria vida que incessantemente se confunde com morte.

A essência humana a ser construída a partir do  pensamento de Jesus, deve ser formada ao longo do caminho, em cada passo, em cada encontro e desencontro, em cada momento de alegria ou de dor. Em cada momento de confronto ou de harmonia. É uma construção que se quer, que se busca, uma construção de uma humanidade melhor a partir de cada indivíduo de boa vontade.   "Bem aventurados os que têm fome e sede de justiça".

Nesse sentido, "Reino de Deus" é aquela condição onde as injustiças  seriam abolidas. Onde ninguém mais teria que morrer de fome ou morrer de guerra provocada pela ambição de poderosos. Não uma condição perfeita, sem dor, sem males, sem perigos. Isso já existiu no Éden e não deu certo e só tinham duas pessoas vivendo lá...O Reino de Deus que se pode construir é contradição que busca simetria.  É trabalho tijolo a tijolo.  Não é trabalho  de um só, de um "Messias", de um escolhido; o trabalho é individual, migalha a migalha, mas com pretensões totalizantes, universais.

Jesus mostrou o seu caminho. É o caminho do confronto, da tensão entre ter e ser; entre não ter e ter que ter; entre não ser e ter que ser. O caminho do "tira a trava do teu olho ao julgar o cisco no olho do teu próximo"; o caminho do "Tive fome e me deste de comer"; o caminho do Samaritano que se solidariza com a dor alheia; o caminho que destrói falsas convicções de privilégios - "até de pedras o Pai pode suscitar filhos de Abraão...". É o caminho que se faz na existência, é um caminho que todos podem buscar a trilha. O alvo pode não se concretizar mas a caminhada é grávida de alegrias.


Feliz páscoa a todos.

quarta-feira, 20 de março de 2024

Lula, colaborador do Dops?

 


                                                                       Lula e Tuma Jr



O jornal Folha de São Paulo em sua edição de hoje, 20 de março de 2023,  informa que o governo  planejava um  pedido de desculpas pelo golpe militar de 1964 e o presidente Lula teria vetado por não querer provocar tensão com os militares.  Os eventos estavam sendo organizados pelo Ministério de Direitos Humanos. O slogam estava até pronto: 60 anos do golpe 1964-2024 - sem memória não há futuro. Organizado pela pasta do  ministro Silvio Almeida, pedia uma ação coordenada entre governo e sociedade civil para lembrar as seis décadas do golpe que se avizinha.

Os documentos reforçavam a importância do Estado pedir desculpas públicas como reparação aos atos perpetrados pela ditadura militar. Muitos aliados de Lula não gostaram do seu veto, como o presidente do PT Rui Falcão que teve um entrevero com o  Ministro da Defesa José Múcio na festa de aniversário de José Dirceu. Segundo Múcio, Lula teria pedido que não houvesse manifestações no meio militar onde em tempos recentes se comemorava a data da chamada "Revolução de 64". Múcio disse que era preciso investir em pacificar o país.

Essa questão me lembrou um outro episódio em 2013 onde o jornalista Reinaldo Azevedo, então um ferrenho crítico dos governos petistas (hoje ele virou a casaca e se tornou um ferrenho defensor de Lula), em sua coluna na revista Veja,  cobrava ao então Ministro da Justiça de Lula, José Eduardo Cardozo que mandasse a PF investigar as denúncias feitas pelo delegado Romeu Tuma Jr em seu livro "Assassinatos de Reputações" publicado em 2013 de que Lula, então líder sindical, colaborava com o governo militar, sendo informante do delegado Romeu Tuma(pai de Tuma Jr), então chefe do Dops no final dos anos 70 e de que o PT produzia dossiês falsos contra inimigos políticos.

Em 1979, o último governo militar de João Batista Figueiredo, iria  promover a Anistia "ampla, geral e irrestrita"  e os militares viam com bons olhos a ascensão de Lula, pois sua figura de líder sindical, ajudaria a ofuscar os recém anistiados mais ideológicos socialistas  como Leonel Brizola e Miguel Arraes. Conforme escreveu Reinaldo Azevedo em seu artigo, 

O Lula “colaboracionista”, pois, é um dado da própria equação. Ainda que seus propósitos fossem os mais, digamos, puros — criar um partido só de trabalhadores —, a verdade inegável é que sua liderança rompia duas pretensões de unidade: a) a unidade da oposição defendida pelo MDB; b) a unidade das esquerdas, que Brizola tinha a ambição de liderar. E aquilo era música para os estrategistas da transição, especialmente o general Golbery do Couto e Silva. Eu era um fedelho, militante da Convergência Socialista, e me lembro bem como a extrema esquerda lia, então, a questão: a: Lula era considerado um nosso aliado contra a “frente burguesa” que pretendia se apresentar como “falsa alternativa” (era o que achávamos então) ao regime; b: Lula era considerado um nosso aliado contra a “falsa esquerda”, que considerávamos não marxista (e era mesmo!), que vinha do exílio com pretensões de liderar as massas, o que repudiávamos; c: Lula era considerado um nosso aliado APENAS ESTRATÉGICO, já que julgávamos que ele não passava de um reformista, com sérios “desvios de direita”, interessado apenas em reformar o capitalismo; d: a extrema esquerda entendia que fortalecer Lula era importante, para que pudesse ser descartado mais tarde.





Fato que dá mais peso às denúncias de Tuma Jr é que ele foi por 3 anos, Secretário Nacional da Justiça do segundo governo Lula, de 2007 a 2010. Segundo revela no seu livro, ele foi instado pelo PT a dar cursos de dossiês fabricados pelo petismo contra seus adversários. Além disso, no governo Lula, Tuma Jr protegia o PT ao não dar curso a investigações que pudessem comprometer o partido. 

Em seu artigo, diante das graves denúncias de Tuma Jr, Reinaldo Azevedo pergunta: "O que fará o Ministro da Justiça?" Não fez nada. 

Em 2010,  quando denúncias contra o Secretário de Justiça de Lula vieram à tona, acusando-o de ser supostamente chefe da máfia chinesa em São Paulo. Lula defendeu Tuma Jr dizendo que ele era um "delegado experimentado" e um "homem que tem uma folha de serviços prestados a esse país". O site G1 publicou a reação de Tuma Jr às denúncias em uma matéria de 5 de maio de 2010: 

Tuma Júnior disse enxergar "uma intenção de desmoralizá-lo", classificou a denúncia de "absurdo" e ainda arriscou um palpite: "Devo estar contrariando os interesses de alguém". O Secretário Nacional de Justiça também estranhou o fato de as acusações virem a público justamente no momento em que ele assume o comando do Conselho Nacional de Combate à Pirataria. "É muito estranho isso aparecer nesse momento", avaliou.

Azevedo fecha seu artigo na Veja com a seguinte frase:

Tuma Junior não era só um datilógrafo do Ministério da Justiça que agora diz ter ouvido coisas. Não! Ele ocupava um cargo central na pasta da máquina  petista de moer a reputação dos adversários, seguindo aquela que, há muito tempo, digo ser a máxima do partido: “Aos amigos, tudo, menos a lei; aos inimigos, nada, nem a lei”.



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Referências:

sexta-feira, 1 de março de 2024

ARMADILHA IDEOLÓGICA

 


Camilo Santana, ministro do MEC


Um dos ministérios mais tumultuados no governo de Bolsonaro foi o MEC, com as constantes tentativas de ideologização do ensino no país. Agora, com o PT de volta ao poder, o outro lado da moeda se mostra: Camilo Santana, Ministro da Educação de Lula, se vê acuado pela tentativa de ideologização no ensino pela ala  esquerda radical do PT. Uma matéria da revista Veja da sua edição de 16 de fevereiro de 2024 deixou claro esse cenário que só piora o já ruim ensino público brasileiro. 


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Por Ricardo Ferraz. 

EXPECTATIVA E REALIDADE Camilo: em meio a embates internos, o bom modelo do Ceará parece sonho distante


SÃO VASTAS as evidências de que é urgente e necessário dar um salto no ensino brasileiro. Há décadas o país figura no pelotão de trás do Pisa, a mais abrangente avaliação internacional da qualidade, feita pela OCDE, o grupo das nações desenvolvidas. Na sala de aula, isso se traduz em um batalhão de alunos que, aos 15 anos, não consegue solucionar problemas triviais de matemática nem entende textos de baixa complexidade. A trilha para a excelência, segundo mostram exitosas experiências mundo afora, envolve a implantação de iniciativas de longo prazo, que não mudem de curso ao sabor das trocas de governo. Neste momento, o Brasil justamente discute seu Plano Nacional de Educação (PNE), que estabelecerá metas para a próxima década, mas, infelizmente, o debate vem sendo atropelado pela ideologia, que em nada contribui para fazer girar a roda da boa educação.

Quem encabeça a grita contra várias ideias que o Ministério da Educação propõe, curiosamente, são alas radicais do próprio PT, mesmo partido do chefe da pasta, Camilo Santana, que encontra nesses colegas de sigla um paredão para seguir adiante não só com o plano, mas também com medidas que miram um avanço. Uma infeliz amostra dessa queda de braço se fez recentemente visível na Conferência Nacional de Educação, a Conae, em Brasília. Liderada pelo Fórum Nacional de Educação, que congrega 49 entidades (a maioria ligada a organizações sindicais e movimentos estudantis), a assembleia, embora de caráter apenas consultivo, decidiu votar pela revogação de dois dos principais pilares do ensino hoje no país: a Base Nacional Comum Curricular, que enfim esclareceu o que o estudante precisa aprender, ano a ano, e o novo ensino médio, que dá uma chacoalhada num modelo sabidamente ultrapassado. “São políticas homologadas no governo golpista de Michel Temer, que não respeitam a vontade dos trabalhadores nem dos estudantes”, diz Heleno Araújo, presidente do Fórum e amigo pessoal de Lula, dando o tom do embate.

Na solenidade de encerramento, uma parcela dos 2 200 delegados recebeu o ministro aos gritos de “Fora Lemann”, em referência à fundação mantida pelo empresário Jorge Paulo Lemann, que atua na área e virou sinônimo de “neoliberalismo nas coisas do ensino”. A mensagem tinha como alvo principal dois quadros do segundo escalão do MEC, nomes da mais alta confiança de Camilo: a secretária de educação básica, Kátia Schweickardt, e a secretária-executiva, Izolda Cela, que mantêm boa conversa com dirigentes da fundação. É só um grão de areia num mar de enroscos bem maior. O episódio, na verdade, escancara uma batalha interna que se desenrola nos corredores do MEC desde o início da gestão de Camilo. Uma parcela dos servidores e funcionários, indicados pelas entidades sindicais, alimentava a expectativa de uma guinada à esquerda para “dar o troco” no governo Bolsonaro.

Essa ala se opõe ao que vê como pragmatismo da “turma do Ceará”, como apelida o grupo mais próximo ao ministro que governou o estado. Braço direito do chefe da pasta, Izolda, a número 2, anda tão desconfortável com toda a situação que confessou a interlocutores cogitar a possibilidade de se candidatar à prefeitura da cearense Sobral, agora que se filiou ao PSB. Nas últimas semanas, ela recebeu parlamentares da oposição queixosos dos rumos do Plano Nacional da Educação, que avisaram que irão jogar pesado na tramitação no Congresso, onde o martelo sobre o texto será batido.

“O documento se mostrou intolerante com quem não está alinhado com o pensamento da esquerda radical. Ouviram um lado só”, critica a deputada federal Adriana Ventura (Novo-SP), que já apresentou um projeto de lei para que a discussão do plano se estenda por mais dois anos, postergando algo que se faz emergencial.

O filtro ideológico também se impõe sobre a educação no outro extremo do espectro político, que já se mexe para fazer valer sua agenda. As poderosas frentes parlamentares da agropecuária, evangélica e da segurança pública — o tripé do boi, da Bíblia e da bala — se articulam para garantir que o PNE contemple o ensino domiciliar e as escolas cívico- militares, e que barre a educação sexual do currículo. O mesmo grupo se prepara para fazer barulho em relação à proposta do MEC de revisão do ensino médio, que, após um ano de extenso debate, acabou voltando atrás em tópicos que lhe desfiguram a natureza. Cedendo aos apelos da base sindical do PT, Camilo apresentou um projeto de lei que reduz a quase metade o tempo em sala de aula que seria destinado aos itinerários formativos, em que o aluno elege as matérias que mais se amoldam a seus interesses. Pois está justamente aí uma das razões de ser da reforma: igual para todos, a atual fórmula não dá espaço para um mergulho mais fundo no que verdadeiramente atrai cada um, resultando em uma grade maçante e ineficaz, distinta do que funciona em tantos países.

Esse é um assunto que promete incendiar os debates no já inflamado Congresso. Descontentes, alguns secretários estaduais, que gastaram vultosas somas para implementar o ensino médio tal qual aprovado no governo Temer, se reuniram com o relator do PL na Câmara, o ex-ministro da Educação, Mendonça Filho (União-PE), pedindo para que mantenha a essência do projeto. “É sempre possível melhorá-lo, mas a ideologização excessiva pode causar enorme prejuízo aos alunos, que precisam estar engajados com a escola e mais conectados com as habilidades exigidas no mundo moderno”, pondera Maria Helena Castro, à frente da concepção da reforma, em 2017. Hoje, cerca de 400 000 jovens abandonam todo ano a sala de aula.

Em meio a tantas contendas, Camilo, que ingressou no MEC sob elevadas expectativas, depois de liderar no cenário escolar cearense uma notável mudança de patamar, se vê com as mãos atadas. Em evento ao lado de Lula, ele ouviu do presidente: “Você tem a missão de superar Fernando Haddad (atual ministro da Fazenda, que já comandou o MEC) como melhor ministro da Educação do Brasil”, disse Lula. Não será fácil. “Ele terá de escolher entre seguir com as políticas que realmente funcionam ou entrar para a história como o responsável por descontinuá-las”, alerta Priscila Cruz, presidente da ONG Todos pela Educação. Que a encruzilhada de Camilo o leve para o lado do que é testado, aprovado e capaz de fazer o país virar a página do mau ensino. 

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Viva São Cosme e São Damião!

Aí um texto publicado no Facebook pelo historiador e deputado Chico Alencar que confere um bom sentido às crenças religiosas e aos costume...