Sebastião Melo na Câmara de Porto Alegre - 📷: Reprodução/RBS TV |
"Numa ditadura, não daria para fazer uma passeata pela democracia. Na democracia, você pode fazer uma passeata pedindo a ditadura" (Mário Sérgio Cortella)
Em seu discurso de posse, na última quarta-feira, o prefeito reeleito de Porto Alegre, Sebastião Melo (MDB), disse que defensores da ditadura não devem ser processados porque isso, a seu ver, representaria "liberdade de expressão".
"Eu quero que nesta tribuna e nas 6 mil casas legislativas municipais e no Congresso Nacional que um parlamentar ou qualquer um do povo que diga 'eu defendo a ditadura', ele não pode ser processado por isso, porque isso é liberdade de expressão".
A leviana fala foi recebida sob aplausos e vaias, logo após o chefe do Executivo ser empossado. E, na sequência, Melo argumentou que defensores do comunismo e do socialismo não merecem ser punidos.
Ao ler a notícia sobre esse fato no portal do G1, fiquei impressionado sobre a que ponto chegaram os atuais quadros do MDB, partido que, no passado, representou a resistência democrática ao regime militar. Aliás, a fala do prefeito de PoA vai totalmente contra o discurso histórico do saudoso Ulysses Guimarães quando a Assembleia promulgou a Constituição de 1988:
"Traidor da Constituição é traidor da pátria. (...) Temos ódio à ditadura. Ódio e nojo. Amaldiçoamos a tirania onde quer que ela desgrace homens e nações. Principalmente na América Latina."
Sinceramente, desde que o MDB embarcou no golpe parlamentar contra a Presidenta Dilma Rousseff, desrespeitando a vontade popular do povo brasileiro expressa nas urnas, parece que o partido se degenerou de vez, ainda que isso não atinja a totalidade de seus quadros. Inclusive, o próprio Michel Temer, maior beneficiário do impeachment em 2016, certamente não seria capaz de tratar uma traição à pátria como um mero exercício da liberdade de expressão.
Assim como o racismo é considerado crime inafiançável e imprescritível, por força da Constituição, não seria forçado afirmar que o mesmo se aplica à defesa da ditadura assim como ao nazifascismo.
Sabemos que, inicialmente, não havia menção ao nazismo na nossa legislação, que era destinada principalmente ao combate do racismo sofrido pela população negra. Apenas em 1994 e 1997 é que foram incluídas as referências explícitas ao nazismo, por projetos de lei apresentados por Alberto Goldman e Paulo Paim.
Fato é que o direito à liberdade de expressão não engloba a apologia da ditadura e nem do nazismo. Lembremos, pois, da ocasião em que o Supremo Tribunal Federal, em 2003, julgou o caso do escritor gaúcho Siegfried Ellwanger Castan, quando este publicara uma série de obras que negavam o Holocausto judeu, sendo que uma delas foi intitulada 'Holocausto Judeu ou Alemão?'. Tratou-se, portanto, do primeiro condenado definitivo por antissemitismo na América Latina.
Desse modo, o STF, ao negar habeas corpus mantendo a pena do escritor, decidiu que "escrever, editar, divulgar e comerciar livros fazendo apologia de ideias preconceituosas e discriminatórias contra a comunidade judaica constitui crime de racismo sujeito à inafiançabilidade e imprescritibilidade". Além disso, a Corte concluiu que "o preceito fundamental de liberdade de expressão não consagra o direito à incitação ao racismo, dado que um direito individual não pode constituir-se em salvaguarda de condutas ilícitas, como sucede com os delitos contra a honra":
"No estado de direito democrático devem ser intransigentemente respeitados os princípios que garantem a prevalência dos direitos humanos. Jamais podem se apagar da memória dos povos que se pretendam justos os atos repulsivos do passado que permitiram e incentivaram o ódio entre iguais por motivos raciais de torpeza inominável"
Portanto, diferente do que defendeu de maneira superficial o prefeito da capital gaúcha, qualquer um que ouse fazer apologia à ditadura merece ser tratado como um criminoso e traidor da pátria. Afinal, tal indivíduo está afrontando o Estado democrático e precisa ser punido sob os rigores do nosso ordenamento jurídico.
Que o MDB não fique inerte diante do que o prefeito de Porto Alegre falou de maneira bem explícita em seu discurso de posse e não permita que os ideais de Ulysses Guimarães sejam esquecidos por novas gerações de políticos sem consciência histórica que muitas das vezes fazem da agremiação uma legenda de aluguel.
Ulysses Guimarães com a Constituição de 1988 |
Ditadura nunca mais!
Comentários
Porque não dizer o que é?
Lula recebeu o já ditador Maduro aqui com tapete vermelho...não ir à posse é uma contingencia dos últimos acontecimentos, mas você sabe que tem gente no PT (partido da democracia relativa) querendo que o governo reconheça a vitória do ditador. A senhora Gleise é uma delas.